Acredito
que o objetivo não é volume de bilheteria, deste país que notadamente se
esforça para seguir em frente com a sua indústria cinematográfica. O amor à
sétima arte supera, de longe, os obstáculos enfrentados por cineastas que
buscam aprovação e recursos para um novo filme. A consequência da luta desse
povo, o Irã, os colocou entre os 12 países que mais produzem cinema em escala
internacional.
E
foi nestes filmes que eu pude presenciar coisas simples, contudo extremamente bonitas.
Destas obras de arte motivadas pela necessidade de expressão, aprendi coisas valiosas dignas de rechear a alma.
Com
eles eu aprendi a ousadia. E foi mesmo ousada a atitude de Panahi de documentar
sua prisão domiciliar, que sucedeu a sua greve de fome. Ambas motivadas pela
tentativa de filmar um roteiro “inadequado”. Mas a sua ousadia não parou por
ai. Este documentário saiu de seu país em um pendrive e viajou até Cannes com o
nome: Isto não é um filme. Título inusitado pra quem, infelizmente, foi
proibido de filmar por 20 anos.
Com
eles eu aprendi mais sobre a verdade. E aprendi a conhecer quem eu sou. Em uma
cena de Filhos do Paraíso, de Majid Majidi, a filhinha do comerciante está com uma xícara de
chá e vai adoçar com um cubinho de açúcar. Açúcar que o pai quebrava pra levar pra a mesquita.
Neste momento o pai a impede, dizendo que aquele açúcar não os pertence.
Percebi neste momento que quem eu sou se manifesta quando estou sozinha, no
momento que posso fazer coisas que ninguém jamais iria saber. E eu preciso
gostar de quem eu sou quando estou livre de olhares e julgamentos. Ai reside a
minha verdade.
Com
eles eu aprendi que a gente arranja um meio. O filme Dez foi filmado com 2
câmeras digitais e o cenário era a vida real que aparecia na janela de um carro
em movimento. Sem pirotecnia, e com muito conteúdo, Kiarostami me mostrou que é
possível fazer excelente cinema com bons diálogos e bons personagens.
Com
eles eu aprendi que é importante questionar, pra poder acreditar. E assim
Kiarostami nos dá o prazer de fazer parte das suas obras. Deixa que a gente
viva nossas próprias experiências ao longo dos seus filmes. Já tive, com uma
amiga escritora, conversas sobre inúmeras possibilidades a respeito do filme
Cópia Fiel. E o melhor é que eu posso estar certa, ela pode estar certa, e nós podemos estar erradas. E isso não nos importa. O que valeu foi a troca de
pontos de vista que o filme nos proporcionou.
Com
eles eu aprendi que a gente tem que deixar ir, deixar ser, pra conhecer
verdadeiramente as pessoas. E nestes filmes isso é feito de maneira natural,
durante as filmagens. Se o personagem ganha forma, nada mais importa. E o
aparato pode nem estar pronto, o diretor pode nem estar pronto, mas o cinema
ganha vida, real, e segue. Tudo é documentado, e a vida vira filme.
Por
tanto aprendizado, desejo vida longa e próspera ao cinema iraniano.
Esta
é a minha homenagem ao diretor que disse que “o relacionamento amoroso é o
único campo em que a experiência não conta para nada, você não aprende nada com
o tempo”. Sábias palavras do mestre Abbas Kiarostami.
E
é também a minha homenagem a cineastas que me ensinaram tantas coisas: Jafar
Panahi, Mohsen Makhmalbaf, Samira Makhmalbaf, Majid Majidi, Asghar Farhadi...
Algumas referências:
O Novo Cinema
Iraniano [Alessandra Meleiros]